Paulo Sergio Fragnito, zootecnista e Vitor Hugo Prado, engenheiro elétrico na Bovitrato, sistema de automação de trato e gerenciamento de confinamento.
O confinamento no Brasil, sofreu grandes transformações ao longo das últimas três décadas, os anos 90 foram caracterizados pela sazonalidade de preços da arroba, o modelo predominante era a engorda de bois castrados de 4 a 5 anos, havia uma oferta grande de bois magros na entrada do inverno, comprava-se arrobas baratas com deságio, para fazer uma engorda rápida com dietas de 50% volumoso ou mais e vender no pico do preço. Tecnicamente o objetivo era maximizar ingestão e conseguir um acabamento rápido, que os animais erados e castrados permitiam.
A década seguinte introduziu mudanças no modelo, a sazonalidade dos preços da arroba se descaracterizou, e ficou difícil identificar os períodos de pico de preço, as exportações de carne ganharam volumes, com o aumento da demanda foi necessário engordar animais mais jovens e inteiros, a oferta de boi magro diminuiu e surgiu ágio na arroba magra. O modelo exigia uma engorda mais eficiente para compensar o ágio, e o boi jovem inteiro precisava de dietas adensadas, vieram as rações com 70% de concentrados e com ela os problemas metabólicos, “bica corrida” e maximizar ingestão já não atendiam o processo, novas dietas e manejos para controlar fornecimento e sobras, evitando a flutuação de consumo e desperdícios, passou a ser essencial no manejo da alimentação.
A década atual acentuou os fatores, o país se tornou o maior exportador de carne do mundo, bois terminados em confinamento aumentaram ano a ano, detectar picos de preços não é mais o foco. Terminação intensiva faz parte do ciclo pecuário, surgiram grandes operações de engorda e a prática de “boitel” definiu um modelo profissionalizado de confinamento, dietas ainda mais desafiadoras com 85% de concentrado ou mais, aditivos, consultorias especializadas em nutrição, em manejo animal e em sanidade surgiram para atender uma atividade crescente e exigente. O modelo atual exige uma engorda com alta produção a custo baixo para diluir o ágio da arroba magra, produzir mais arrobas aumentaram o período de cocho, que já ultrapassa 100 dias.
Neste modelo, o processo de alimentação determina o desempenho dos animais, a viabilização da atividade depende do controle eficaz da nutrição, para isso misturadores de ração com pesagem eletrônica embarcada pesam cada ingrediente carregado, depois medem a quantidade fornecida em cada curral, mas neste cenário desafiador de custos e dietas adensadas, é necessário ir além das pesagens, é preciso que dados registrados se tornem informações para técnicos e gestores tomarem decisões.
Durante o carregamento a dosagem de cada ingrediente comparado com a quantidade solicitada mantém a ração fabricada em conformidade com a formulada.
As leituras matinais dos cochos definem o ajuste do trato para cada lote a cada dia, uma vez definida a quantidade a ser fornecida o tratador tem uma meta a ser cumprida durante o dia, ele precisa registrar cada quantidade fornecida, em cada trato e para cada lote, assim no último trato ele saberá a quantidade exata a ser fabricada e distribuída, para bater a meta de trato que o manejo de cocho definiu.
É necessário que o processo seja preciso no carregamento e na distribuição para que a nutrição dos animais alcance o objetivo que técnicos e gestores esperam.
Tantas mudanças na atividade ao longo de 3 décadas, exigindo processos controlados e eficientes, era de se esperar que equipamentos modernos e inteligentes surgissem nessa trajetória, porém os recursos existentes nas balanças atuais são os mesmos que haviam na década de 90, obrigando os tratadores a anotar registros em planilhas e digita-los, para os técnicos e gestores analisar. O controle se torna difícil e lento, influencia negativamente na disponibilidade e precisão da informação, prejudica a produtividade de máquinas e operadores, e impede que técnicas de nutrição de precisão e manejos de alimentação sejam implantados efetivamente nos confinamentos.
Há um grande desencontro nesta área, de um lado as indústrias que fabricam os misturadores, não são solicitadas a evoluírem, e optam por equipamentos consagrados do mercado, que tem como foco robustez, operação em condições hostis e baixo custo.
De outro lado os desenvolvedores de software buscam soluções adaptadas a partir de computadores, e vários periféricos montados dentro da cabine, para manter uma conexão entre balança e computador, e assim conseguirem automatizar a coleta das informações. Uma solução de custo alto e complexa, limitando o uso a unidades que têm infraestruturas e equipes de TI para implementar e manter a aplicação funcionando.
Por fim, os confinadores ainda estão céticos quanto a exigirem de seus fornecedores, fabricantes de máquinas e desenvolvedores de softwares, soluções e equipamentos eficientes, automatizados e informatizados que tragam a tão sonhada, Alta Tecnologia No Trato Bovino, para dentro dos confinamentos.
Técnicos, gestores e empreendedores necessitam deste avanço tecnológico para consolidarem técnicas de nutrição de precisão e gestão de riscos em confinamento, é preciso que os elos desta cadeia se mexam em busca do avanço tecnológico.
Unir conhecimentos de nutrição animal, engenharia eletrônica, engenharia de computação e gestão de processos para desenvolver “balanças” inteligentes, com sistemas de localização GNSS e comunicação máquina para máquina, têm que sair dos textos que falam da agropecuária 4.0 e passar a ser realidade no trato de animais. O uso dessas tecnologias de forma rotineira por técnicos, gestores e empreendedores da pecuária, deveria ser abundante tal como é na agricultura, onde os avanços tecnológicos, a tornam cada vez mais competitiva e eficiente.